Violência permitida ou permissão para a violência ... (FolhaBV)

21/02/2014 00:55

Robert Dagon

Os últimos acontecimentos anotados pela imprensa por rádio, jornal ou televisão remetem-nos a um passado não muito distante. Durante vinte e um anos a tortura oficial, a delação, a expulsão de opositores do País, a prática de racismo, a censura estabelecida, eram parte da realidade. Houve até um presidente militar que afirmou "farei do Brasil uma democracia e quem não quiser eu mato, prendo e arrebento". Os grupos de extermínio proliferavam à caça de comunistas, subversivos, ladrões de galinha, mendigos, culminando com o assassinato de opositores, de ex-presidentes da república, de estudantes, sindicalistas do campo e da cidade. Só não eram caçados os políticos que a ditadura indicava, a ferro e fogo, para ocupar espaço após o fechamento do Congresso e a cassação sem processo de governadores eleitos. Muitos dos "indicados" estão vivos e se disseminaram por todo o Brasil, sem que Roraima seja exceção à regra. Alguns dos atuais "líderes" de RR "herdaram" do regime militar seus mandatos, fizeram disso meio de vida e ficaram ricos, muito ricos. Assim também seus parentes, aderentes, cônjuges, denominando-se os únicos "inteligentes" da Terra de Macunaíma. Só eles e somente eles têm "massa cinzenta" para ocupar os mais altos cargos desta Unidade da Federação.

 Este relato anterior tem tudo a ver com a onda de violência que assola o Brasil de norte a sul e de leste a oeste. É claro que, felizmente, lutamos e estamos sob um regime democrático frágil, porém necessário, fruto de muita luta, sangue, suor e lágrimas. Então, onde está a semelhança? Arrisco responder: está na famigerada aliança firmada há quinze anos entre a ampla maioria da chamada "esquerda" e setores históricos do regime autoritário de 1964. O que aparece como tema redundante é apenas um indício do problema. O ladrão de uma galinha, o meliante comum, é alvo fácil de linchamento, apedrejamento, surras e outras formas de violência. O ladrão do galinheiro vira autoridade, tem fórum privilegiado, é intocável, presta serviços comunitários, dorme na cadeia, tem celular, compra mandato para roubar o dinheiro público "organizadamente", com contabilidade, respaldo judicial e judiciário, consegue cumprir mandato público, se reelege, tudo sob a proteção legal, com as chamadas "liminares", as quais resultam em "eliminar milhares" nos hospitais, nas escolas, na falta de merenda escolar, de estradas, de dinheiro para a agricultura.

Os representantes do Estado apenas se limitam a criminalizar o movimento social organizado, dirigido contra a (des)ordem estabelecida. Calam-se perante o trabalho já não mais silencioso de grupos para militares, racistas, neonazistas, "justiceiros", infiltrados nas manifestações populares legítimas. Não podem moral ou eticamente punir, são coautores, podem e devem ser responsabilizados.

Por último, em RR, a novidade do DENATRAN / DETRAN-RR com a "placa eletrônica", projeto piloto de um voo autoritário.  Seremos obrigados a usar, em um primeiro momento, coleiras, pulseiras, em nossos automóveis. Seremos "seguidos" pela autoridade do trânsito na ida para a escola, para o restaurante, para a praia e para o motel. Teremos o direito constitucional de ir e vir (parágrafo primeiro: "vigiados"). Da pulseira nos carros à nossa própria haverá talvez algumas resistências. Teremos em Roraima, depois dos campos de concentração nazistas, a primeira grande penitenciária aberta do Mundo.

Interessante o que diz Aldous Huxley, em "Admirável Mundo Novo":

"O abençoado intervalo entre a excessiva falta de ordem e o pesadelo da ordem em excesso não começou e não dá sinais de começar". (HUXLEY, 1957: 16).

O cientificamente possível é eticamente viável? O Admirável Mundo Novo, escrito por Aldous Huxley em 1931 é uma "fábula" futurista relatando uma sociedade completamente organizada, sob um sistema científico de castas. Não haveria vontade livre, abolida pelo condicionamento; a servidão seria aceitável devido a doses regulares de felicidade química e ortodoxias e ideologias seriam ministradas em cursos durante o sono.

Robert Dagon, bancário.

Publicado em Folha de Boa Vista, 20140221.